31 outubro, 2006

"Why I Write" - George Orwell

8. "All writers are vain, selfish and lazy, and at the very bottom of their motives there lies a mystery." (p10)
1. "Putting aside the need to earn a living, I think there are four great motives for writing, at any rating of writing prose"; (p4)
2. "Sheer egoism – desire to seem clever, to be talked about, to be remembered after death, to get your own back on grown-ups who snubbed you in childhood, etc. etc." (p4)
3 e 4. "Aesthetic enthusiasm – perception of beauty in the external world, or, on the other hand, in words and their right arrangement. Desire to share an experience which one feels is valuable and ought not to be missed." (p5)
5. "Historical impulse – desire to see things as they are, to find out true facts and store them up for the use of posterity." (p5)
6. "Political purpose – (…) desire to push the world in a certain direction to alter other’s peoples idea of the kind of society that they should strive after." (p5)
7. "I write it [a book] because there is some lie that I want to expose, some fact to which I want to draw attention, and my initial concern is to get a hearing." (p8)
(“Why I Write”, George Orwell, 1946)

28 outubro, 2006

Mistério matinal

1. Todo dia de manhã eu recebo uns papéis aqui em casa.
2. Eles vêm cheios de desenhos e rabiscos pretos, brancos e coloridos.
3. Eu não sei de onde vem, nem pra que servem.
4. Toda manhã chegam folhas novas, com desenhos e rabiscos que freqüentemente se repetem – eles mudam um pouco, o suficiente para se parecerem sem serem os mesmos.
5. Sempre folheio as páginas cheias de histórias procurando um manual de uso (ou uma explicação de sua utilidade), mas nunca encontrei nada.
6. Quando eu acumulo uma pilha de papéis de vários dias, coloco tudo para fora.
7. No dia seguinte eles desaparecem e eu fico imaginando se eles não são simplesmente embaralhados e mandados de novo pra mim alguns dias depois.
8. Comecei a rasgar, queimar e engolir essas folhas, para ver se eu começo a receber algo diferente, ou se elas param de aparecer.

27 outubro, 2006

Deu de novo

1. Às vezes dá vontade de gritar.
2. Outras, de jogar o carro da ponte pro rio engolir.
3. Tem aqueles dias que eu não sei por que sair da cama – e, eventualmente, eu nem saio.
4. De vez em quando, penso que a solução é parar alguma pessoa na rua e elogiar seu vestido colorido, seu jeito de correr, suas costas, qualquer coisa que torne a vida um pouco mais agradável.
5. Ou então seguir essa pessoa até sua casa e ver o que ela faz depois de jantar.
6. Nos piores dias, penso em rasgar tudo o que eu já fiz, esquecer os lugares que visitei, começar do zero – mas o medo de acabar fazendo tudo de novo é maior.
7. Na maioria das vezes eu me escondo num livro, numa caminhada, num filme ou por aqui.
8. Às quintas-feiras eu leio Batman e passa.

26 outubro, 2006

“The Old Man and the Sea” – Ernest Hemingway

1. “You violated your luck when you went too far outside.
2-4. ‘Don’t be silly’, he said aloud “and keep awake and steer. You may have much luck yet. I’d like to buy some if there’s any place they sell it’, he said.
5. What could I but it with? he asked himself.
6. Could I buy it with a lost harpoon and a broken knife and two bad hands?
7, 8. ‘You might’, he said. ‘You tried to buy it with eighty-four days at sea’. ” (p117)
(“The Old Man and the Sea”, Ernest Hemingway, 1952)

25 outubro, 2006

De queijo

1. Desde o começo ele amou o jeito como ela falava, como se encarasse e envolvesse as entranhas de seus ouvintes.
2. Desesperado ante aquele decote, arriscou soterrado por outros impulsos menos lisonjeiros: “Amei o seu vestido!”
3. Confessou sussurrando que a amava enquanto ela adormecia no seu peito, exausta.
4. Definitivamente amou daquele jeito que eles descobriram juntos numa noite quente.
5. Aprendeu a superar as brigas, as agonias e os silêncios intragáveis em que ela o exilava quando ele esquecia de lembrá-la do quanto a amava.
6. Amou todos os tipos de amores que teve por ela, mesmo os que doíam ou os que nem ela (nem ele) compreendia.
7. Com o tempo, passou a amar as tardes na varanda tomando chá e vendo os meninos (filhos, que depois se metamorfosearam em netos) jogando bola enquanto as folhas caíam devagar.
8. Hoje em dia ele ama mesmo o suflê de queijo que ela faz aos sábados quando tem visita.

24 outubro, 2006

Paisagem

1. Eu costumava amamentar nossa filha na sacada do prédio porque ela gostava do vento e dos barulhos da cidade.
2. Da sacada, eu observava com zelo ela brincando na piscina com os primos de Bragança.
3. Antes do jantar, eu saía para a sacada para ver ela se despedir das outras meninas que jogavam na rua enquanto a noite nascia.
4. De madrugada, esperava os faróis do nosso carro velho chegarem apalpando a rua até encontrar a porta da garagem para poder ir dormir tranqüila.
5. Eu lia o jornal na sacada quando me ligaram avisando.
6. Agora, para além dos morros de prédios que cercam o horizonte, na minha frente vislumbro aqueles campos verdes de beleza estéril e de tranqüilidade desoladora.
7. Acima, depois das nuvens, das estrelas e dessa angústia sufocante, nossa filha me espera do seu lado.
8. Abaixo, são só quinze andares que me separam de vocês.

19 outubro, 2006

Banquete

1. De aperitivo, Morphine fatiado bem fininho com um copo de Baden Powel.
2. Depois, salada Green Day com queijo Ray Charles.
3. Nos dias mais frios, recomendo também um caldo do mangue de Chico Science.
4. Para dar um toque especial ao filé de Led Zeppelin, uma pitada (pequena, se não perde o sabor original) de Sex Pistols.
5. O molho Metallica pode ser feito com ou sem pedacinhos de Elvis.
6. Chico a gosto (eu normalmente ponho bem pouquinho, por causa da pressão, mas há quem não viva sem ele).
7. Para beber, uma taça de um Piazzolla suave.
8. De sobremesa, Fionna Apple.

18 outubro, 2006

8:01

1. Oito anjos em cavalos, num sonho.
2. Oito dívidas na cobrança, e um plano.
3. Oito horas numa pista, e uma aposta.
4. Oito zeros no prêmio, e uma certeza.
5. Oito cavalos na corrida, e um disparo.
6. Oito segundos e uma angústia, na derrota.
7. Oito balas num revólver, e uma dor.
8. Oito filhos e uma viúva.

17 outubro, 2006

Genética

1. A bisavó de Fábio participou da semana de 22.
2. O bisavô de Fábio lutou na guerra civil espanhola.
3. A avó de Fábio estava em Woodstock e em Praga.
4. O pai de Fábio foi torturado no Araguaia.
5. A mãe de Fábio era assistente fotográfica do Glauber.
6. O irmão de Fábio marchou em Seattle.
7. Fábio está concluindo seu MBA, opera um off-shore com sede em Bahrein e anunciou ontem seu noivado com uma estilista texana.
8. “E o pior é que ele é hetero!”, gritou o enfartado pai de Fábio.

16 outubro, 2006

À luz de velas

1. Durante o jantar, ela reencontra aquele amigo e os dois começam a cantar divertidas canções em francês.
2. Você sorri para os dois enquanto tenta decifrar (mesmo sem entender nada dessa lígua) que música é essa e que sorriso é esse que ela não tira do rosto.
3. A orquestra esboça um tango, e ele nem se preocupa em pedir licença para rodopiar com ela pelo salão, dançando lentamente na frente da sua mesa.
4. Depois de duas horas dele descrevendo a influência das alvoradas de Roma nos seus últimos quadros, você pede o quinto café e a conta.
5. A mão dela se aproximou da dele para pegar a bolsa ou ele interceptou o gesto dela propositadamente?
6. Já passou tanto tempo que você começa a duvidar se eles realmente foram ao banheiro.
7. Um sentimento forte de desgosto traz de volta a lembrança de como ela parecia próxima de você antes de ele chegar.
8. Traído, você levanta da sua mesa e atravessa o restaurante vazio até chegar à mesa que eles deixaram vazia.