18 janeiro, 2008

Silêncio sozinho covarde

Uma mulher entra na lanchonete e percebe o único homem, sozinho numa mesa com quatro lugares, próximo ao balcão.
Ela pode sentar-se na frente dele, e ele poderia se tornar o homem da sua vida. Há também o assento oblíquo, nem diretamente ao lado nem à frente, mas próximo suficiente para dizer “Oi, sou a Cláudia, trabalho na loja da esquina... você gosta de cinema?” ou fazer uma piada sobre como o lugar estava cheio, “Ainda bem que fiz reservas com antecedência...”. Ou numa das mesas vizinhas, poderia só elogiar a gravata dele, um tom profundo e calmo como o céu no início de uma noite refrescante de verão, e ver pra onde iriam as coisas a partir daí.
Mas não. Ela senta-se em outra mesa, próxima a uma pilastra, e mastiga sua solidão vagarosamente. É uma distância segura para impedir qualquer risco de contato, mas ainda é próximo o suficiente para permitir olhares fugazes enquanto ela imagina se ele saberia beijar seus lábios inferiores como o ator da novela, se sua voz seria grave e reconfortante como a de seu avô, ou se ele seria um bom pai para seus filhos.
Na saída, pensa em perguntar se ele tem um isqueiro, mas percebe a placa com o círculo riscado, cortando o cigarro ao meio, e sai da lanchonete silenciosa e covarde.

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